segunda-feira, 19 de junho de 2017

Ambientalista Ricardo Portugal comenta sobre seminário

Prefeitura de Nova Iguaçu faz seminário manipulado
sobre a floresta do Tinguá no Instituto Multidisciplinar da 
UFRRJ
       Foi uma verdadeira manipulação o Seminário “Parque Nacional de Tinguá: uma visão de futuro para a Baixada Fluminense promovido pela Secretaria do Meio Ambiente, Agricultura e Turismo de Nova Iguaçu no auditório do Instituto Multidisciplinar da UFRRJ. O evento integrou a programação da Jornada Ambiental de Nova Iguaçu, alusiva à Semana Nacional do Meio Ambiente.
       Na mesa, apenas discursaram os apologistas do “parque” em Tinguá, como Francisco Livino, chefe do Parque Nacional da Serra da Bocaina; Walter Behr, ex-chefe do Parque Nacional do Itatiaia; Carlos Alberto Mesquita, diretor da Conservation International e o empresário Jaime Ríos, diretor do Parque Nacional da Patagônia e do Instituto Nacional de Promoção Turística (Improtur), órgãos do governo da Argentina. Em suas falas, um detalhe os unificava: TODOS revelaram não conhecer a Rebio-Tinguá, ignorando solenemente a formidável capacidade de abastecimento de água e a riqueza incomensurável de sua biodiversidade florística e faunística.
      Logo de início, os promotores do seminário (Fernando Cid, secretário de Meio Ambiente de Nova Iguaçu e Hélio Vanderley, seu subsecretário) cometeram uma gafe imperdoável: numa atitude desrespeitosa, inaceitável e absurda contra a srª Gisele Medeiros (chefe da Rebio-Tinguá, que estava presente ao seminário) não a convidaram para compor a mesa dos palestrantes, demonstrando desprezo pela UC e sua chefia. A mesma permaneceu anônima na plateia, apesar das reclamações que dirigimos aos promotores do evento.
   Isso sem falar no menosprezo à floresta do Tinguá constando no próprio título do seminário, chamando a mesma de “parque nacional”, esquecendo que a citada UC é uma Reserva Biológica, tombada pela UNESCO como patrimônio da Humanidade/ Reserva da Biosfera. O título do seminário era “Parque Nacional do Tinguá: uma visão de futuro para a Baixada Fluminense
     O festival de manipulações prosseguiu. No momento em que se abriu para as perguntas do público presente, foram destinados apenas três minutos para as intervenções. E toda vez que havia um posicionamento pró Rebio-Tinguá, o senhor Hélio Vanderley intervinha e discursava pelo tempo que bem entendesse, apenas para desconstruir a falação anterior.
     A própria criação da Reserva do Tinguá, em 23/05/89, foi motivada por estudos que apontavam seus elevados índices de endemismos de flora e fauna. Por reconhecerem sua importância para a manutenção da riqueza biológica da Mata Atlântica, pesquisadores e gestores do então IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), órgão do Ministério do Meio Ambiente, decidiram por uma categoria de Unidade de Conservação (UC) que assegurasse a preservação desse rico patrimônio biológico. Vinte e oito anos após a sua criação, as pesquisas científicas reafirmam a necessidade premente de manter protegida a biodiversidade deste bioma, ainda tão pouco conhecido pela Ciência. No local, registra-se a descoberta, em 1965, pelo professor e pesquisador da UFRRJ Eugênio Izecksohn do menor anfíbio do mundo, popularmente conhecido como “sapo pulga”, além de registros recentes de cinco espécies de falconiformes (gaviões) no interior da Rebio-Tinguá, conforme trabalho de campo intitulado “Registros recentes de Falconiformes na Reserva Biológica do Tinguá. RJ” realizado pelos ornitólogos André de Mendonça-Lima e José Fernando Pacheco.
      Os pesquisadores em questão concluem seu trabalho com a seguinte afirmação: “Devido aos importantes achados relacionados neste trabalho, maiores esforços com respeito à preservação devem ser despendidos na área da Rebio do Tinguá. Cinco espécies registradas durante este estudo aparecem em pelo menos uma lista de espécies ameaçadas, destas o gavião-de-penacho (S. ornatus) aparece em cinco listas de animais ameaçados.Logo, se espera que autoridades competentes exerçam seu papel no que tange a conservação da reserva em questão, pois a mesma está praticamente ilhada em uma matriz urbana e sofre os efeitos deste isolamento (e.g. queimadas, caça, desmatamentos, invasões, entre outras injúrias)”.
      A Reserva Biológica do Tinguá é uma das Unidades de Conservação do país mais afetadas por empreendimentos de infra-estrutura, como por exemplo as linhas de transmissão de energia de Furnas e as três faixas de dutos (duas de óleo e uma de gás) da Petrobras, que correm no subsolo da floresta constituindo-se em iminente risco de incêndio na mata e de poluição de seus lençóis freáticos subterrâneos.
   Denunciamos que tais empresas, além da Cedae, não fornecem nenhuma contrapartida compensatória ao ecossistema da Reserva pelo uso que fazem de seu território. Há também um aterro sanitário funcionando numa área do entorno e a proximidade com a Refinaria Duque de Caxias. Tais fatores resultam em distúrbios ecológicos causadores da perda da biodiversidade da Rebio-Tinguá.
      Colocamos também que quase 80% do abastecimento público de água da Baixada Fluminense dependem da Reserva Biológica do Tinguá, onde foram instalados diversos aquedutos e represas de captação, até hoje cumprindo importante função social de auxílio ao Rio Guandu e que remontam à época do Império.
       Destacamos a presença de Áreas de Proteção Ambiental (APA’s), que compõem a zona de amortecimento da Rebio-Tinguá e que se encontram precariamente implementadas pelos municípios que fazem limite com a reserva (dentre eles, Nova Iguaçu).
   Defendemos que o ICMBio apóie a implementação destas UC’s (unidades de conservação municipais), que podem cumprir o papel de uso público sem gerar impactos ambientais sobre a Rebio-Tinguá, além de permitir o desenvolvimento de negócios ecologicamente sustentáveis para as economias locais.
      Portanto, concluímos nossa intervenção no seminário afirmando que quaisquer propostas de mudança de categoria desta UC, tendo em vista o Uso Público, deverão considerar os custos ambiental e social decorrentes dos impactos gerados por este uso.
       Ainda nesta linha, enfatizamos que não há nenhum embasamento científico que justifique a necessidade de mudança de categoria com vistas ao cumprimento do objetivo da existência desta UC. Muito pelo contrário, todas as pesquisas existentes apontam para a necessidade de investimentos maiores em proteção e uso restrito da Reserva Biológica do Tinguá, tendo em vista seu potencial hídrico, sua riqueza científica e a fragilidade de sua biodiversidade por conta das espécies ameaçadas de extinção. Não entendemos, portanto, a origem e o porquê da proposta de recategorização desta UC defendida e patrocinada pela Secretaria de Meio Ambiente de Nova Iguaçu, a qual consideramos um equívoco técnico que coloca em risco desnecessário a integridade daquele bioma da Mata Atlântica, especialmente em tempos de acaloradas discussões sobre a flexibilização da legislação ambiental federal.
       Nossa abordagem desmascarou também o discurso pró-parque dos palestrantes, que enalteceram o direito ao acesso ecoturístico universal da população nesses locais. Rebatemos afirmando que num parque o acesso é cobrado dos visitantes, sem a garantia que essa arrecadação vá mesmo para a preservação daquela UC, uma vez que a verba é administrada por uma empresa terceirizada, encarregada da gestão do parque.
      Se levarmos em conta a situação social de carência, abandono e pobreza característica daquela região, concluiremos que o advento do “parque” em Tinguá provocará exclusão e marginalização desses contingentes populacionais empobrecidos de sua área de entorno, alijando-os do direito de freqüentarem a floresta para contemplar sua exuberância cênica. Ao passo que numa Reserva Biológica a entrada é inteiramente gratuita a todos os visitantes. Tal visitação está voltada para o caráter instrutivo e para fins de educação ambiental e pesquisa científica.
      A esse propósito, lembramos ainda que a mudança de categoria somente será possível mediante consulta ao Poder Legislativo Federal, o que certamente abrirá espaço para interferências de setores publicamente contrários à existência das Unidades de Conservação, como o agronegócio, cuja bancada é bastante expressiva no Congresso Nacional.
Argumentamos que, ao contrário de "inclusivo" e "universal", o discurso pró "ecoturismo" em Tinguá é excludente, pois estará voltado aos que possuírem recursos financeiros para essa prática.
     Seus defensores sabem (mas não dizem) que o estado de penúria e precariedade atual da Rebio-Tinguá não está necessariamente vinculado à categoria de unidade de conservação implantadae sim à ausência de uma política pública ambiental efetiva no país, onde o governo federal é o grande responsável pelo abandono e sucateamento em que se encontram as áreas ambientalmente protegidas. Ou seja, tanto as reservas biológicas quanto os parques nacionais federais (e também estaduais) sofrem com a ausência de investimentos públicos para a preservação de seus recursos naturais.

Ricardo Portugal - jornalista e ambientalista.
Movimento Pró Reserva Biológica do Tinguá.

Ps. do Blog: Fica reservado aos citados o direito de responder o autor do texto. A opinião do jornalista e ambientalista Ricardo Portugal necessariamente não representa a opinião do Blog. 

Pois é!!!

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